sábado, dezembro 02, 2006

Preguiça

Hoje eu acordei com preguiça. Por sorte, é sábado e não preciso trabalhar. Assim, fiquei deitado e acabei pensando sobre a preguiça.

Por que será que a preguiça é uma coisa tão mal vista, por que a gente não pode se dar o direito de estar com preguiça e admitir isso sem que fique com aquela sensação de culpa, ou sem que os outros olhem para a gente como se fossemos uns inúteis?

Afinal de contas, tem bicho mais preguiçoso que gato? E todo mundo acha gato legal, bonitinho. Então, por que a gente não pode dar uma pausa de vez em quando, se espreguiçar que nem o gato e não fazer absolutamente nada?

Vejamos por exemplo a idéia de lazer. Chega o fim de semana e temos a nossa “hora de lazer”. Significa ir à praia (engarrafamento, procura por um lugar para estacionar, barraca, criança...), ir comer fora (outra vez engarrafamento, vaga, flanelinha, fila de espera...), ir ao cinema (não vou repetir), ou ir para algum lugar dançar até de madrugada, chegando em casa exaustos de tanto “lazer”.

Na segunda-feira, ao chegar no trabalho, tem sempre alguém que pergunta como foi o fim de semana. Se você disser que ficou em casa dormindo, vai ser olhado como um perdedor, ou um doente. Não, você tem que relatar atividades de deixar maratonista cansado (à propósito, correr maratona na “hora de lazer” pega bem).

E as férias? Férias boas são aquelas em que a gente viaja, de preferência passando por vários lugares, nem que seja naquele esquema de excursão em que tem horário para acordar, horário para comer, horário para ir ao banheiro, itinerário pré-definido, comandado por um sargento alemão disfarçado de guia de turismo. Férias sem fazer nada são consideradas tempo perdido.

Mas, nem sempre foi assim. Até há pouco tempo, era costume “tirar a sesta”, aquela parada no meio do dia, para almoçar e tirar um cochilo reparador. O próprio ritmo da vida era mais lento, refletindo a maior lentidão dos transportes e das comunicações. Era o tempo em que se levava horas escrevendo uma carta à mão, que era enviada pelo correio, que por sua vez a transportava por terra ou navio. Hoje em dia, a garotada acha e-mail lento! O negócio é comunicação instantânea via torpedo no celular. Me surpreendo que ainda não tenhamos o “transporte” do Jornada nas Estrelas...

Não sou contra o progresso, até porque o progresso trouxe os computadores e eu dependo deles para ganhar a vida e poder ter minhas horas de lazer. Mas, acho que está faltando um equilíbrio entre as obrigações e as horas de não fazer nada. Afinal de contas, se estamos sempre ocupados fazendo algo, seja trabalhando ou tendo lazer, quando é que paramos para pensar, para avaliar as nossas sensações, nossas idéias?

Uma vez eu li em algum lugar que um grupo de executivos americanos se reuniu com um empresário japonês para discutir uma proposta de negócio. Os americanos falavam, apresentavam slides e gesticulavam. O japonês olhava tudo calado e, depois de um tempo, fechou os olhos e ficou com uma expressão serena, relaxada. Os americanos consideraram aquilo um desaforo, falta de profissionalismo, pois acharam que o japonês havia dormido durante a reunião. Mas, estavam totalmente errados. O japonês havia fechado os olhos para se concentrar, evitando as distrações provocadas pela visão e fazer aquilo que poucas pessoas fazem: refletir antes de falar, antes de tomar uma decisão.

Assim, da próxima vez que você tiver um tempo livre, experimente não fazer nada. Experimente curtir a sua preguiça e observe os resultados. Pode ser que isso requeira um pouco de prática, afinal de contas, não se freia um trem em alta velocidade de repente.

Eu, por minha vez, ainda estou com preguiça e vou parar de escrever este artigo, para poder me dedicar à arte de não fazer nada.