domingo, agosto 26, 2012

Diários de Viagem: 14 - Misticismo, Beleza, Emoção e Aborrecimento

Depois de na véspera termos explorado a região das Colinas do Golan, era hora de arrumar as malas e seguir em frente, mais uma vez com pena de ir embora. O dia, como sempre bonito, prometia muitas atrações interessantes que, como vocês vão ler adiante, geraram muitas emoções, boas e más. Mas, uma coisa de cada vez e vamos começar do começo.

Caminho do dia, começando em Ramot e terminando em Tel-Aviv


O nosso primeiro destino era a cidade mística de Tsfat (ou Tzfat, ou Safed, etc.), na Galiléia. Esta cidade, que segundo a lenda foi fundada por um dos filhos de Noé, é a mais alta de Israel por estar a 900 metros de altura. É considerada mística porque muitos dos rabinos e estudiosos cabalistas que fugiram da Inquisição na Espanha se estabeleceram em Tsfat, tornando a cidade o centro da Cabala, imagem reforçada por alguns acontecimentos que muitos julgam ser milagrosos, alguns bastante recentes.

Entretanto, quem ler a história da cidade, verá que ela é muito trágica, tendo sido vítima de várias guerras e conquistas por povos diferentes (que em geral tinham uma coisa em comum - a matança de judeus), de alguns terremotos que destruíram bairros inteiros e até mesmo de doenças que mataram boa parte da população da época. Mais recentemente, em 2006, a cidade foi alvo constante de foguetes disparados pelo Hezbolah no sul do Líbano.

Como levaríamos cerca de 45 minutos do hotel em Ramot (letra A no mapa) até Tsfat (letra B), acordamos cedo, tomamos o café da manhã, nos despedimos dos donos do hotel e pegamos a estrada.

Como vocês acompanharam, até agora tínhamos feito tudo sozinhos: elaboramos o nosso próprio roteiro, selecionamos o que ver, onde ficarmos hospedados, quanto tempo passarmos em cada lugar, sem ajuda de excursões ou guias. Mas, quando estávamos pesquisando sobre Tsfat, lemos vários comentários dizendo que a cidade seria melhor explorada com alguém que a conhecesse bem e soubesse onde ir, principalmente tendo pouco tempo disponível, já que pretendíamos passar apenas 3 horas lá, pois ainda tínhamos outras cidades para visitar. Assim, antes mesmo de partirmos para Israel, decidimos contratar uma guia, que estava com excelentes referências e depoimentos de clientes anteriores.

Nos correspondemos por e-mail e ficou acertada a data e o local em que nos encontraríamos em Tsfat. Ela nos mandou uma explicação super detalhada de como chegar lá, que funcionou perfeitamente, apesar do caminho de rato que tivemos que fazer pelas estradas estreitas e curvas da região. Chegamos na hora marcada e ela já estava a nossa espera.

A guia, chamada Aviva, é uma senhora de uns 70 anos de idade, muito ativa e falante. Americana, mora em Israel desde a década de 50 e é guia licenciada (coisa levada muito a sério em Israel, requerendo muitos cursos e certificações), conhecendo tudo e todos em Tsfat, onde mora.

Ela entrou no nosso carro e indicou para onde deveríamos seguir para estacionar. Chegando lá, deixamos o carro e fomos caminhar pelas ruas estreitas de Tsfat, muito bem cuidadas, com várias lojinhas e muitas coisas artísticas. A primeira parada foi uma loja de velas. Ora, você deve estar pensando: que coisa mais sem graça! Mas, essa era uma loja de velas especiais, verdadeiras esculturas em cera. Cada uma mais fantástica que a outra. Logicamente, depois de muita indecisão sobre o que escolher, acabamos comprando algumas. Não deixem de ver as fotos (link mais adiante).

Em seguida, nos embrenhamos pelo labirinto de ruas da cidade, até sairmos na sinagoga Ari Ashkenazi. Apesar do nome, a sinagoga original, do século 16, era sefaradi, tendo sido construída em homenagem ao rabino sefaradi Isaac Luria (conhecido com o Ari - o Leão). O prédio atual foi construído após o original ter sido destruído pelo terremoto de 1837. A sinagoga é famosa não só pelo ilustre nome, mas também por talvez ser a sinagoga mais antiga ainda em funcionamento em Israel, além do colorido e originalidade da decoração da arca onde fica a Torah e pelo fato de que um milagre teria acontecido lá.

Na guerra de 1948 os árabes lançaram uma bomba que caiu no pátio defronte a sinagoga. Os estilhaços da bomba voaram por todo canto na sinagoga, que estava cheia, mas ninguém foi atingido. A Aviva contou que as pessoas estavam dentro da sinagoga rezando, pois era sexta-feira (Shabat). Há um momento nas orações do Shabat em que as pessoas se curvam para a frente, em sinal de respeito. Isto dura talvez um ou dois segundos. No exato momento em que as pessoas se curvaram, um estilhaço entrou no salão, passou por cima das pessoas curvadas e furou a parede. Nas fotos, mostro o buraco deixado na parede. Lenda? Milagre? Coincidência? Deixo cada um decidir...

A sinagoga estava muito cheia, pois além do entra e sai de turistas, um Bar Mitzvá estava em andamento (era quinta-feira). Saindo da sinagoga, continuamos caminhando pelas ruelas estreitas de Tsfat, com a Aviva à frente, surpreendentemente em passos rápidos, contando sobre a história e fatos da cidade. Entramos em uma galeria de arte com esculturas muito bonitas (e caras) e passamos por uma rua em que estava se apresentando um grupo de Klezmer (grupo musical, normalmente de judeus ortodoxos). Tsfat é a capital mundial de Klezmer e sedia o Festival Anual de Klezmer.

Continuamos até outra sinagoga antiga, a Joseph Caro. Esta também foi reconstruída depois do terremoto e tem Torahs de 200, 300 e 500 anos de idade, além um armário de escritos muito antigos. A sinagoga é mantida desde o começo do século 20 por uma mesma família, com recursos de doações e da renda de uma lojinha anexa, de artigos religiosos.

A seguir, fomos visitar uma fábrica de uma família que por gerações vem produzindo queijo de cabra. Havia muitos tipos, com direito à prova e Patrícia comprou alguns. Aproveitamos para tomar um sorvete caseiro. 

De lá continuamos passeando pela cidade, até chegarmos a outra sinagoga antiga, do século 15, chamada Abuhav, em homenagem a outro rabino cabalista sefaradi, Isaac Abuhav. O terremoto destruiu esta também, restando apenas uma parede, que foi preservada na reconstrução. Como o antigo Templo, a entrada externa (da rua) e a interna (da sinagoga mesmo) são separadas por um pátio. Esta sinagoga tem uma disposição interna muito peculiar, comum às sinagogas sefaradis da época, muito ampla e bonita, apesar de simples (não deixe de ver as nossas fotos). Os elementos decorativos e as paredes tem vários detalhes, cada um com um significado (alguns cabalísticos), que não vou detalhar aqui para não tornar este blog muito chato, mas quem quiser saber mais, pode ir neste site (em inglês).

Esta foi a última sinagoga que visitamos em Tsfat. Em seguida, entramos no bairro dos artistas, com muitas lojas de artesanato. Vimos muitas coisas bonitas, mas ou eram muito caras, ou muito grandes, ou muito frágeis para levar na mala. Acabamos comprando um camelo antigo de metal, que hoje decora a nossa sala de estar.

Por sugestão do Jacques, desde Jerusalém eu vinha tentado tomar um suco de romã feito na hora. Estava difícil por não ser época de Romã. Mas, como Tsfat é a cidade dos milagres, consegui!

Bebendo suco de romã em Tsfat

Passamos pelo local onde a cidade foi defendida do ataque do exército árabe na Guerra da Independência em 1948, com paredes cheias de marcas de tiros. Conta a história que ali aconteceu mais um milagre: Tsfat na época era uma cidade com uma população de 1500 pessoas, majoritariamente de estudiosos idosos. Quando foi declarada a independência de Israel, o árabes inconformados atacaram em várias frentes, incluindo Tsfat. Havia na cidade 221 judeus com idade para lutar, além de mais 136 que vieram ajudar. O exército árabe contava com 10700 homens que, além da vantagem numérica, estavam mais bem armados. A arma principal dos judeus era uma peça de artilharia (morteiro) "caseira" chamada Davidka. A Davidka fazia muito mais barulho do que estrago. Por coincidência (ou não) quando os judeus começaram a atirar com a Davidka, caiu um temporal fortíssimo sobre a região. Já há algum tempo corria rumores entre o exército árabe de que Israel havia conseguido a bomba atômica. Com o barulhão causado pela Davidka e o simultâneo temporal, o exército árabe fugiu em pânico achando que era a bomba atômica e Tsfat se salvou!

Seis Davidkas foram fabricadas no total e hoje há em Israel várias ruas, praças e monumentos em homenagem às Davidkas. Uma delas se encontra em exposição em uma praça de Tsfat, mas não lembro de termos passado por ela. 

Nossa caminhada por Tsfat já durava quase 3 horas e estava chegando ao final. Visitamos outra galeria de artes bem grande, quase que um museu, e nos despedimos da Aviva, que nos explicou como chegar ao nosso carro, já que o marido dela vinha busca-la. Logicamente, nos perdermos, mas depois de ziguezaguearmos um pouco, achamos. Veja as fotos de Tsfat clicando aqui.

Seguimos para a costa, rumo a Rosh HaNikra (letra C no mapa acima), que é o ponto norte mais extremo de Israel, na fronteira com o Líbano. Levamos cerca de uma hora até lá, deixando as belas colinas para trás e voltando para o visual do Mediterrâneo. Nosso objetivo era visitar as famosas grutas no mar.

Ao chegarmos, tinha uma verdadeira frota de ônibus de excursão estacionados. Compramos os ingressos e ficamos esperando pelo teleférico que nos levaria para o nível do mar, já que estávamos no que parecia ser o alto de um desfiladeiro de rochas calcárias brancas, como giz. Havia turistas de várias nacionalidades, incluindo muçulmanos com as mulheres cobertas da cabeça aos pés, a despeito do forte calor.

A descida pelo teleférico é rápida, mas a vista do Mediterrâneo, como sempre, é muito bonita, dando para ver várias cidades na costa israelense. Imagino que algumas delas tenham sido Akko e Haifa, mas não tenho conhecimento suficiente para afirmar.

Ao chegarmos embaixo, entramos por um túnel, que tem uma história interessante: durante o domínio britânico, durante a segunda guerra mundial, os ingleses construíram dois túneis através das rochas de Rosh HaNikra, ligados por uma ponte sobre as grutas, para criar uma estrada de ferro entre Cairo a Istambul, permitindo assim o suprimento das tropas inglesas. Anos depois, em 1948, na expectativa de um ataque do Líbano, a ponte foi destruída pela Haganá (exército de Israel), na operação "Noite da Pontes", a maior e última operação da Haganá antes da independência, quando 11 pontes ligando Israel ao países árabes foram destruídas. Hoje, a estrada de ferro ainda é usada na parte israelense, terminando ao sul de Rosh HaNikra, em Naharya, enquanto a parte do Líbano em diante foi desmantelada. O túnel que levava ao Líbano foi selado.

Dentro do túnel, há um "cinema" onde assistimos a um vídeo contando a história do local, desde os tempos antigos. Depois, entramos no caminho (bastante escorregadio por causa da maresia) que desce ainda mais, levando às grutas, chegando praticamente ao nível do mar. As ondas entram pelas grutas e estouram contra as rochas, fazendo um barulho estrondoso e espirrando água. São várias grutas e em alguns lugares há umas aberturas, como se fossem "varandas", de onde se vê a água muito azul e cristalina do mar.

Depois, subimos na rocha, de onde se tem uma vista desimpedida para o mar (como no Arpoador) e a costa de Israel. Não tem como expressar em palavras a beleza, portanto veja as fotos, no link a seguir.

Pegamos o teleférico de volta e fomos tirar mais umas fotos lá em cima, de onde se vê o arame farpado, o muro e guarita que separam Israel do Líbano. Imagino a tensão que deve pairar no ar quando o Hezbolah lança foguetes do Líbano para Israel...

Veja as fotos de Rosh HaNikra clicando aqui.

De Rosh HaNikrá descemos pela costa, até Haifa (letra D no mapa lá em cima). Mais uma vez, o trânsito entre Akko e Haifa estava muito ruim e só piorou na entrada de Haifa. Chegamos lá mais tarde do que planejávamos, o que inviabilizou a visita ao Jardins Bahai (veja na internet fotos, pois parece muito bonito).

A ida a Haifa tinha um motivo muito especial: foi a cidade onde meu pai nasceu e viveu até se mudar para o Brasil. Iríamos conhecer o prédio que minha avó tinha, onde toda a família vivia. O GPS dessa vez não decepcionou e chegamos direitinho, estacionando em frente ao prédio. Apesar de na vizinhança ter uma espécie de mercado, com várias lojas de frutas, verduras, peixes, etc. a rua era tranquila. O nome da rua é Shemesh (Sol) e é meio ladeira (como quase todas em Haifa, que fica na encosta do Morro Carmel). A região parece ser modesta, com prédios baixos e bem cuidados, com vista para o enorme porto de Haifa (o principal de Israel).

O prédio obviamente é antigo, mas está bem conservado para a idade. Foi muito emocionante estar na rua onde meu pai deve ter brincado quando garoto, de ver o pátio do prédio onde ele dizia ter montando em um burrinho, e imaginar como teria sido a vida ali há cerca de 60-70 anos. Tiramos fotos e fomos caminhando para as ruas próximas, onde estava o mercado. Como mencionei, havia muitas lojas, a maioria de comestíveis, com as mercadorias expostas em balcões do lado de fora, num colorido similar ao que vimos no mercado Yehudá de Jerusalém. Entramos numa padaria, que parecia ter pães, biscoitos e bolos muito bonitos. Como estávamos com poucos Shekels e não aceitavam cartão, negociamos pagar em dolar e compramos algumas coisas, inclusive rosquinhas de gergelim quase iguais às que minha avó fazia (depois nos arrependemos de não ter comprado mais, pois estavam ótimas). Passamos também por um supermercado, onde fizemos mais algumas compras. Imaginei se meu pai havia feito compras nestes lugares também, a mando da minha avó, apesar que provavelmente as lojas na época eram outras.

Veja as fotos de Haifa clicando aqui.

Foi com muita emoção que demos uma última olhada no prédio e pegamos o carro, em direção ao nosso destino final do dia - Tel Aviv (letra E no mapa acima). O trânsito até que não estava dos piores e chegamos lá por volta de 6 da tarde. Nosso hotel, o Crowne Plaza, ficava de frente para a praia e esperávamos ser o mais luxuoso da viagem, que terminaria ali.

Deixamos o carro com o manobreiro e fomos fazer o check-in. Estávamos muito cansados, pois havia sido um dia muito longo. No balcão, notei logo que algo não estava certo, pois as duas atendentes começaram a conversar entre si em hebraico ao invés de simplesmente me dar a chave. Ai uma delas me disse que a nossa reserva era para o outro hotel da cadeia, no centro da cidade. Ora, eu tinha certeza que não, então mostrei para ela a cópia da reserva que eu tinha no meu celular. Este foi o começo de um aborrecimento enorme.

Ela chamou o gerente de Relações a Clientes. Demorou e quando chegou, ele veio com a história de que o "sistema" havia cometido um erro e transferido a minha reserva, e que o hotel estava lotado. Para completar, pasmem, ele "me informou" que o erro não tinha sido meu (puxa, obrigado!) e nem deles (é mesmo?). Eu tive que conter a Patricia neste momento, pois ela estava prestes a voar na jugular do idiota. Não aceitei e disse para ele que o "sistema" não era uma entidade amorfa, sem dono. O "sistema" era do hotel, portanto a responsabilidade de consertar o erro era do hotel, já que dois dias antes eu havia recebido uma confirmação do próprio "sistema" de que estava tudo certo e, ironicamente, dizia que nenhuma ação era necessária de minha parte. Além disso, todo hotel deixa sempre uns quartos de reserva, para situações inesperadas como essa.

Ele negou, dizendo que estava lotado e que o outro hotel seria bom, que teríamos transporte diariamente para ir e voltar à praia. Não aceitei e exigi que ou ele me arrumasse o quarto que reservei no hotel, ou nos colocasse em algum dos outros hotéis do lado, de mesma categoria, pela mesma tarifa que eu havia reservado. Ele disse que ia tentar, ofereceu um drinque no bar, que rejeitamos, pois apenas queríamos dele o quarto a que tínhamos direito e ele sumiu. Ficamos sentados no hall luxuoso do hotel, cansados, com a nossa bagagem do lado, fumegando de raiva.

De vez em quando ele aparecia para dizer que ainda não tinha conseguido nada, mas acho que era tática para nos cansar. Vendo que isso não ia dar em nada, pedi à Vivian, que estava nos EUA, para ligar para o atendimento a clientes do Crowne Plaza nos EUA e reportar o que estava acontecendo, pedindo providências.

Neste meio tempo, Patricia tinha ido ao banheiro e demorou a voltar. Só no dia seguinte ela me contou o motivo e descobri que vivo com uma terrorista: ela sabotou o hotel! Ela contou que no andar em que ficava o banheiro estava tendo uma festa e que colocaram flores decorando o banheiro. Ela pegou as flores, "plantou" nos vasos sanitários e decorou tudo com papel higiênico! Imagine a cena de surpresa e estupefato quando alguém foi ao banheiro e encontrou a bela decoração. Só de imaginar, dá vontade de rir...

A pessoa com quem a Vivian falou nos EUA confirmou que a nossa reserva estava correta, que o hotel não poderia fazer isso e que iria ligar para eles. Foi o que resolveu. Depois de algum tempo, um outro cara veio dizer que realmente ligaram dos EUA e que o problema estava resolvido: estavam em contato com o gerente do hotel do lado, o Herods, da mesma categoria, e que iriam nos transferir para lá. Pediram que fizemos o pagamento no próprio Crowne Plaza e nos ofereceram como cortesia o estacionamento gratuito, convites para o jantar de Shabat no Crowne, e acesso à uma espécie de sala vip no Herods, onde haveria comidas e bebidas à disposição.

Levaram nossa bagagem para o Herod's e andamos até lá, já que era pegado. Ao chegarmos lá, a recepção estava muito cheia e custamos a ser atendidos, o que irritou ainda mais. Para a nossa surpresa, ninguém sabia de nada! Ligaram para o Crowne Plaza duas vezes até tudo se acertar e finalmente fomos para o quarto. Nessa brincadeira, já era noite e nosso humor era péssimo.

O quarto era bom, com vista lateral para a praia, mas a água do chuveiro era ridiculamente fraca e o ar condicionado central não estava funcionando. Liguei para a recepção, informaram que estavam consertando e que deveria ficar bom na manhã seguinte (não ficou). Depois de um banho de pingos, descemos para a tal sala vip, onde comemos alguma coisa e fomos passear pela calçada da praia que, apesar da hora, estava bem cheia com gente jogando volei e pessoas sentadas nas mesas dos bares. 

Como estava escuro, tiramos apenas duas fotos que podem ser vistas clicando aqui.

Depois de um dia de misticismo de Tsfat, beleza em Rosh HaNikra, emoção em Haifa e aborrecimento em Tel Aviv, só nos restava ir dormir, pois o dia seguinte seria o nosso último dia em Israel.

No próximo capítulo, relaxando em Tel-Aviv.

------------------------------------------

Clique aqui para o próximo capítulo.

Clique aqui para o capítulo anterior.

terça-feira, agosto 21, 2012

Diários de Viagem: 13 - Desbravando o Golan

Depois de uma noite de sono profundo no silêncio do hotel em Ramot, acordamos com mais um dia de sol. A região toda (Galiléia e Golan) é uma das mais bonitas e agradáveis de Israel, com campos férteis (coisa preciosa num país desértico), vegetação exuberante, riachos e montanhas.

Visitando esta região, a gente entende como ela é importante para Israel do ponto de vista geográfico, estratégico e econômico. As montanhas formam uma defesa natural nas fronteiras com Líbano e Síria. Os campos férteis permitem o plantio, essencial para a economia doméstica e exportações. A água, talvez o principal recurso, é vital, pois o Rio Jordão é praticamente a única fonte de água doce de Israel.

Como éramos os únicos hóspedes, o café da manhã estava nos aguardando na hora marcada. Ele foi servido no andar de cima da casa/escritório dos donos e foi bem simples, nada de mais. Conversamos um pouco com a dona, uma senhora simpática e retraída, enquanto o marido tinha uma personalidade mais "exuberante", meio casca grossa, mas boa gente também.

Como teríamos que pagar o hotel em dinheiro por causa da confusão que o hotels.com fez com a nossa reserva, ele sugeriu que fôssemos à uma cidade próxima, chamada Qatsrin (ou Qatzrin, ou Katzrin - essas variações de transliteração do hebraico são de enlouquecer GPS!), onde poderíamos sacar. Depois de tomarmos o café, andamos um pouco pela propriedade, muito florida e bem tratada e tiramos algumas fotos, que podem ser vistas clicando aqui.

Desbravando o Golan
Pegamos o carro e, de Ramot (letra F no mapa ao lado, que pode ser ampliado clicando nele) descemos na direção do Lago Tibérias (ou Mar da Galiléia, ou Lago Kineret). Paramos na beira só para "registrar" que estivemos lá, molhando os pés e as mãos, já que a "praia" mesmo ficava em Tibérias e não tínhamos tempo. O lago, famoso principalmente na fé cristã (pois foi onde Jesus foi batizado), é bem grande, com água clara e fundo de pedras. A água, que estava meio fria, vem das montanhas para o Rio Jordão que então desagua no lago.

De lá, pegamos a estrada rumo a Qatsrim (letra B no mapa). As estradas na Galiléia e no Golan em geral são estreitas, com muitas curvas, subidas e descidas, já que vão serpenteando entre as colinas. É um passeio muito agradável.

Qatsrim não era longe e chegamos rapidamente. É o maior assentamento judaico da região e, por isso, considerado "a capital do Golan", com cerca de 6700 habitantes. Por incrível que pareça, foi difícil acharmos uma vaga para estacionar e finalmente conseguimos, próximo a um pequeno shopping center, que tinha um supermercado, algumas lojinhas e uma agência do correio. Aproveitamos para despachar alguns postais, sacamos o dinheiro no próprio correio e fizemos algumas compras no supermercado. Foi interessante ver uma cidade pequena típica do interior de Israel.

De lá pegamos a estrada novamente, continuando rumo norte, para a fortaleza de Nimrod (letra C no mapa). Nimrod é uma fortaleza medieval, localizada a 800 metros acima do mar, construída em torno do ano 1229 pelos árabes, para se defenderem dos cruzados. Depois das cruzadas, ela perdeu a utilidade e aos poucos foi se deteriorando, tendo também sido bastante danificada por um terremoto no século 18. Hoje é um parque nacional.

Foi meio complicado chegar lá, porque o GPS se perdia e a gente ficava rodando. Passamos por alguns momentos meio estressantes, como por exemplo quando estávamos num trecho muito estreito de uma estrada de mão dupla, no alto de um desfiladeiro e vinha um caminhão enorme do outro lado, quase jogando a gente lá embaixo, ou quando o GPS nos levou para uma vizinhança árabe em que tivemos a sensação de sermos fuzilados com os olhares...

Depois de muito tempo perdidos e de quase termos desistido, finalmente conseguimos chegar. O visual lá de cima é fantástico, porque dá para ter uma vista de 360 graus do Golan todo, ou pelo menos boa parte dele, com suas muitas colinas.

As ruínas da fortaleza se estendem por uma área bastante grande, com muito sobe e desce de escadas. Nas construções que sobraram, nota-se sempre a preocupação com a defesa do local, evidenciada por janelas que são pequenas do lado de fora mas amplas do lado de dentro (para permitir vários arqueiros atirarem e não serem atingidos), corredores com saídas ocultas (para uma eventual fuga), cisternas subterrâneas (para garantir o abastecimento de água), além evidentemente de paredes e muralhas reforçadas.

Um fato interessante: Há um filme israelense (muito bom, por sinal), chamado Beaufort, sobre o Castelo Beaufort, que fica no sul do Líbano (na parte que durante um tempo foi dominada por Israel). Como não dava para filmar lá, a filmagem foi feita em Nimrod. Ou seja, Nimrod fez papel de dublê para Beaufort...

A fortaleza tem uma parte que é como se fosse uma fortaleza menor dentro da maior. Essa parte tinha uma construção mais alta no meio, como uma torre. Como já tínhamos subido e descido muito, a Pat não queria subir e então fui sozinho para fotografar e filmar lá do alto. A escadaria era grande e vinha descendo um grupo escolar de adolescentes israelenses na faixa de uns 13 a 15 anos de idade, naquela bagunça habitual. No meio do caminho, eles passam por mim, eu me encolho no canto para dar passagem e ouço dizerem em inglês: "Sejam bem vindos ao nosso país. Nós amamos vocês" e continuaram descendo, enquanto eu, pasmo, continuei subindo. Realmente Israel é um país de surpresas infindáveis...

Veja as fotos tiradas no lago Kineret e na fortaleza de Nimrod clicando aqui.

Vista aérea de Nimrod (clique na foto para ampliar)

Saindo de Nimrod, dirigimos para Banias, que ficava a poucos quilômetros (letra D no mapa). Banias é outro parque nacional, famoso pela sua cachoeira. Ao chegarmos na entrada do parque, fomos no guichê apresentar o nosso passe que dava direito ao ingresso. Aí o guarda/atendente perguntou se estávamos levando água e, ao respondermos que não, sugeriu que levássemos. Compramos então duas garrafas na lanchonete próxima. Podia ser até que ele ganhasse comissão, mas o conselho dele valeu: a caminhada pela trilha dentro do parque foi feita sob um sol escaldante, abafado. Apesar de ter bastante vegetação, talvez pela umidade, o calor era terrível.

A trilha era meio íngreme em alguns pontos, mas facilitava o fato de que em geral estávamos descendo. Aos poucos (depois de mais de meia hora andando), começamos a ouvir barulho de água ao longe. Aí a trilha virou escada e depois um caminho dentro da mata, o que aliviou o sol, mas aumentou a umidade. Parecia estarmos fazendo sauna. De repente, começamos a ver algumas corredeiras e quedas de água, achando que aquilo era a cachoeira. Fui tirando fotos e filmando, mas a medida que continuamos andando, o negócio não acabava, cada vez com mais corredeiras e quedas e começamos a desconfiar que a cachoeira mesmo ainda estava por vir.

Depois de um tempo, o barulho de água foi aumentando e aí sim chegamos à cachoeira. Muito bonita, forte e foi até difícil fotografar de perto devido aos respingos no ar. Por outro lado, considerando o calor, foi um bom refresco. A cachoeira é resultado de uma nascente no monte Hermon (o mais alto do Golan), que desce 3,5 km por um desfiladeiro até entrar no parque de Banias e formar a maior cachoeira de Israel. Essa nascente, 9 km depois da sua origem, encontra com o Rio Dan e juntos formam o Rio Jordão.

Por sorte, o caminho de volta era mais direto, ainda que subindo, e foi mais fácil voltar. Parece que tinha uma outra trilha que levava para mais uma cachoeira ou para a nascente desta, mas já estava tarde, além de não termos mais disposição para encarar mais uma trilha...Veja as fotos de Banias clicando aqui.

Cansados e com fome, pegamos o carro para irmos a um restaurante na beira do Rio Dan (mencionado acima), chamado Dag Al HaDan (Peixe no Dan). Ele ficava próximo (letra E no mapa acima), mas para variar, demoramos porque o GPS não achava. O que acontece em Israel é que os nomes das ruas e lugares são escritos em hebraico e quando transliterados para o nosso alfabeto, várias versões diferentes surgem, o que dificulta localizar no GPS. Para piorar, a maioria dos lugares tem um nome em hebraico, outro nome em árabe e muitas vezes um terceiro nome no nosso alfabeto. Por exemplo, a cidade de Acre chama-se Akko em hebraico e Akka em árabe...

Bom, depois de várias tentativas, finalmente chegamos. O restaurante é realmente escondido no meio da mata e ao estacionarmos ficamos na dúvida se era ali mesmo, porque do estacionamento só víamos umas casinhas, o rio, a mata e umas galinhas soltas correndo (resolvemos que não seria uma boa pedir um prato de frango). Mas, era lá mesmo. O ambiente é bem interessante: chão de terra, mesinhas na beira do rio, cercadas por árvores de copas altas. A especialidade: trutas de rio, criadas ali mesmo.

O garçom era bem jovem, mais ou menos da idade do Marcelo e, para variar, adorava o Brasil. Disse que tem um tio que mora em SP e que quando acabasse de servir no exército estava pensando em abrir um negócio com o tio no Brasil. Ele descreveu umas trinta formas em que serviam as trutas. Não lembro tudo, mas tinha frita, assada de vários jeitos, na brasa, defumada, etc. e com diversas opções de acompanhamentos. No guia de viagem em que achei este restaurante, o autor brincava dizendo que a truta que você comer provavelmente ainda estava viva enquanto você estacionava o carro...

Como em todo restaurante que se preza em Israel, ele trouxe um monte de aperitivos, que por si só já seriam uma refeição mas estávamos famintos, pois já passavam das 5 da tarde e não tínhamos almoçado. Depois vieram as trutas. Até eu que não sou muito chegado a truta gostei. Muito bem preparadas, molho (de amêndoas) excelente. Para completar, uma sobremesa maravilhosa: lava cake (bolo com chocolate derretido no meio) e sorvete.

Como não tiramos foto da comida, achei essa na Internet que é semelhante ao que foi servido

Foi uma refeição perfeita. O lugar é excelente, tranquilo, agradável. A nossa mesa era literalmente na beira do rio, com fundo musical da água rolando por entre as pedras. Apesar de estarmos cercados de mata, não havia insetos porque há uma tela gigantesca cobrindo tudo. O mais engraçado era ver os galos (muito bonitos) empoleirados no alto das árvores, cantando de vez em quando.

Satisfeitos, dirigimos por cerca de uma hora de volta para o hotel (letra F no mapa), curtindo a vista das colinas do Golan e depois do Lago Kineret, com o sol se pondo na direção dele. Veja as fotos do restaurante e do caminho de volta, clicando aqui.

Originalmente tínhamos planejado ir à noite em Tibérias, mas o cansaço não deixou e resolvemos encerrar mais um dia maravilhoso em Israel ficando no hotel e vendo as fotos do dia.

No próximo artigo, tour pela cidade mística de Tsfat e de volta à costa para conhecer Rosh HaNikrá e uma visita emocional à Haifa, antes de continuar para Tel-Aviv.

------------------------------------------

Clique aqui para o próximo capítulo.

Clique aqui para o capítulo anterior.